Por falar em eleições (II): A origem das normas fundamentais

Por Rafael Jordão Vecchiatti*

O termo Democracia, “o regime da maioria”, também tem a conotação de regime político aberto, participativo, representativo, isonômico e respeitador do Estado de Direito. Utilizado por inúmeros países, infelizmente, essa atribuição não representa a realidade dos fatos. Na prática, poucos podem demonstrar estas tão necessárias características na conduta das suas instituições.

Aliás, democracia, aqui, é um termo genérico. Talvez devesse ser república. Como veremos mais adiante, ao abordarmos algumas das principais contribuições, os filósofos que preconizaram o estabelecimento da liberdade, como base para uma forma de governo, não vincularam a democracia a esse sistema.

Poderia ser uma monarquia, não despótica, desde que constitucional e republicana.

Um regime constitucional representativo, baseado na liberdade individual e no efetivo estado de direito.

O mundo político entre os séculos XVII e XVIII era dominado por regimes monárquicos absolutistas, muitos dos quais tirânicos. Esta foi a escola para os pensadores que buscavam a liberdade como filosofia de vida. Podemos imaginar, então, que a evolução do pensamento liberal percorreu um longo caminho até tornar-se um sistema político. E aqui outra ressalva: Os proponentes das políticas liberais, infelizmente, nunca lograram alcançar todos os seus propósitos. Mesmo na Inglaterra, que é chamada a terra natal do liberalismo. Em que pese ter sido bastante limitada, a supremacia das idéias liberais foram, ainda assim, suficientes para mudar a face da Terra. Locke, Kant, Hume, Smith, Tocqueville, Stuart Mill e Montequieu, estão entre os homens que dedicaram grande parte de suas vidas à causa da Liberdade. 

As Normas para prevenirem o arbítrio despótico, eles e outros nomes não menos importantes, idealizaram um sistema de governo imune aos abusos de quem quer que estivesse no poder. Formularam um sistema de governo onde prevaleceriam os ditames da verdadeira lei, não a vontade dos homens no poder.

Um sistema fundamentado na liberdade individual e no princípio do Estado de Direito, onde o voto – simples processo de escolha – é apenas, uma das características.

O Estado de Direito

O verdadeiro Estado de Direito significa a adoção de dois princípios fundamentais, que o homem civilizado aprendeu após essa longa vivência: O primeiro, que todos os órgãos de um sistema de governo devem ter perfeitamente definidas e limitadas as suas funções (a separação e limitação dos poderes institucionais) e, segundo, que as leis para serem verdadeiras devem ser normas gerais de justa conduta, iguais para todos e aplicáveis a um número indefinido de casos futuros. Portanto, normas gerais, abstratas, prospectivas, isonômicas. E devem possuir, respaldo ético e moral.

Não se deve confundir Estado de Direito com a pseudo legalidade que os políticos atuais não se cansam de usar. Para isso, utilizam instrumentos coercitivos de toda a espécie, que podem ser denominados de qualquer coisa, menos de lei. Para um grande número deles, as “leis” não precisam ser iguais para todos (principalmente para eles), podem ser discricionárias, ante esse ou aquele segmento da sociedade. No quesito da isonomia, os exemplos brasileiros são simplesmente chocantes.

Enquanto vemos os políticos acusados de corrupção, fraude e desvio de verbas públicas, terem FORO PRIVILEGIADO, nenhum cidadão sequer pode prestar concurso a cargo público se estiver sendo processado.

Da mesma forma, políticos e servidores públicos têm critérios de aposentadoria extremamente privilegiados se comparados ao do trabalhador comum. Até bem pouco tempo, enquanto o setor privado que contribuía com 70% da receita da previdência, recebia menos de 20% dos benefícios, enquanto o setor público, contribuindo com menos de 20% da receita, recebia 70% dos benefícios.

Esses são exemplos dos inúmeros e absurdos privilégios que a classe política criou para si e parece incrível que muitos brasileiros ainda acreditam que, por votarem, estamos todos na “Democracia Plena”.

A representatividade popular obtida eleitoralmente, não é condição suficiente para garantir um regime verdadeiramente livre e democrático. Precisamos também responder à questão fundamental de como os representantes eleitos governarão para o povo. O que a grande população ignora, é que a simples aplicação do método democrático de escolha, sem uma clara definição que estabeleça os limites de ação do governo, é comparável à troca de monarcas.

Uma Constituição tem por objetivo, exatamente isso: definir as normas de um sistema de governo, sem tratar de detalhes de legislação ordinária, como normas trabalhistas e outras aberrações. A nossa irresponsável Constituição de 1988 demonstra claramente o incrível desconhecimento (e má fé) dos nossos políticos/ constituintes.

O que ocorre é que, sem uma clara definição de atribuições e limitações, a efetiva separação de poderes. Os políticos manipulam a máquina governamental a seu bel prazer. E esta é outra razão para que o Estado não possua qualquer atividade econômica!

Leia o primeiro e o terceiro artigo desta série.

*Rafael Jordão Vecchiatti é presidente do Atlântico – Instituto de Ação Cidadã

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