Uma decisão recente do Supremo Tribunal Federal (STF) poderá levar a anulação de sentenças tributárias definitivas – transitadas em julgado e sem direito a recurso. Assim, se houver mudança na jurisprudência e a Corte passar a considerar determinado tributo devido, uma sentença terminante anterior favorável ao contribuinte poderá perder efeito e a Receita Federal e demais entes fazendários poderão exigir os pagamentos retroativos.
No último dia 8/2, o STF julgou especificamente uma discussão entre a União e os contribuintes sobre o recolhimento da Contribuição Social Sobre Lucro Líquido (CSLL). Diversas empresas haviam contestado a cobrança do imposto na década de 1990 e obtiveram vitórias definitivas da Justiça. Entretanto, em 2007, o STF decidiu pela constitucionalidade do tributo. As empresas com decisões anteriores favoráveis entenderam que não seriam afetadas pela sentença de 2007, segundo o princípio constitucional da segurança jurídica.
Agora, a nova sentença do STF revoga decisões concludentes anteriores e é retroativa, portanto, estas empresas poderão ser obrigadas a recolher a CSLL de 2007 a 2023, conforme o caso.
O argumento simplório usado pelos ministros do Supremo foi de que a isenção afetaria a igualdade de concorrência em um mesmo setor, pois, enquanto algumas empresas conseguiram a isenção de determinado tributo por decisão judicial, outras, não.
Segundo o Estadão, grandes grupos empresariais serão afetados pela sentença. Entre eles, o Pão de Açúcar (GPA), BMG, Zurich Seguros, Banco de Brasília (BRB), Holding Alfa, Samarco, Magnesita, Grupo Ale Combustíveis e Kaiser. Algumas companhias com ação na Bolsa já divulgaram fato relevante ao mercado, indicando os valores envolvidos.
O caso tem repercussão geral, assim, os efeitos se estendem a outras situações tributárias e demais contribuintes em todo o país.
A decisão do STF tem cunho político-arrecadatório e ajudará sobejamente a reforçar o caixa do governo, como admitiu o próprio secretário do Tesouro Nacional, Rogério Ceron. Poderá ainda gerar ganhos bilionários de arrecadação à União, ao custo do pagamento de tributos que as empresas tinham garantido na Justiça o direito de não pagar.
O jurista e tributarista Miguel Silva, Conselheiro Jurídico do ATLÂNTICO, reforça “quanto à prejudicialidade dos efeitos da decisão do Supremo, em toda a cadeia econômica brasileira. A catastrófica decisão afeta diretamente a retomada da atividade econômica pós-pandemia, os empregos, a renda dos trabalhadores e consequentemente a própria arrecadação de tributos, tendo em vista o reflexo direto no resultado final e no sensível fluxo de caixa das empresas”.
Afirma Miguel Silva que “é importante que o STF reveja oportunamente sua decisão e as comunidades empresariais e jurídicas não fiquem passivos diante de tamanha insegurança jurídica, e que, no mínimo, sejam respeitados princípios basilares constitucionais, de modo a impedir a cobrança retroativa após a decisão da Corte Suprema, do contrário, a Guardiã da Carta Magna está patrocinando a desestabilidade das relações obrigacionais tributárias, função que lhe cabe refutar”.
O jurista completa: “A referida decisão do Supremo afronta a cláusula pétrea da garantia jurídica da coisa julgada (art. 5º, XXXVI, da Carta Magna). Ora, a própria Constituição Federal valoriza a segurança jurídica, é nítido o rol de garantias constitucionais: o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada.”
Como remédio jurídico, frente à decisão do STF em repercussão geral (Temas 885 e 881), a Câmara dos Deputados já recebeu duas PECs e seis projetos de lei que requerem um quórum maior para validade das decisões do Supremo e o amplo respeito a princípios constitucionais inafastáveis, dos quais o ATLÂNTICO – Instituto de Ação Cidadã apoia publicamente.
A iniciativa privada e os empreendedores serão as primeiras vítimas dessa absurda revisão conduzida pelo STF. “Será que os senhores ministros não enxergam o óbvio mal que estão causando à segurança jurídica? E, na prática, levando ao afastamento dos investidores do Brasil? Será que não percebem a gravidade dessa decisão para o progresso econômico da Nação? É preciso que a sociedade repudie veementemente este ato, que cria a insegurança jurídica no Brasil”, defende Rafael Vecchiatti, presidente do ATLÂNTICO. “Se quisermos um país próspero e civilizado, precisamos, pelo contrário, restaurar a confiança nas leis e nas instituições, inclusive no STF”.