Reforma apressada do IR prejudica toda a sociedade

O governo tenta aprovar com urgência o PL 2.337/21, que propõe uma reforma estrutural da legislação do Imposto de Renda. O texto é longo, complexo e não foi objeto de ampla análise e discussão, nem por especialistas, nem por entidades representativas da sociedade, recebendo fortes críticas de todos os entes atingidos, diga-se: dos empresários, profissionais liberais e estados e municípios.

Na tentativa de votação da semana passada, a última versão do texto foi protocolada menos de 24 horas antes da sessão deliberativa. A Câmara dos Deputados segue com a intenção de votar o projeto nesta terça (17 de agosto).

A pressa em aprovar o projeto não se justifica, pois a tributação sobre a base do consumo é o principal problema do nosso sistema tributário, não a tributação sobre a renda. A legislação do Imposto de Renda é estável e não gera muitas polêmicas e litígios. Tanto empenho pela reforma indica que a real intenção do governo é, de fato, a elevação da carga tributária e a antecipação de recursos tributários, com foco nas próximas eleições.

Unanimidade negativa

A falta de debate com a sociedade e a resistência em ouvir as advertências dos especialistas, demonstram uma atitude muito pouco republicana.

Os estados e municípios são desfavoráveis à reforma, pois os cortes propostos no IRPJ, visando compensar a tributação de 20% sobre os dividendos, devem resultar em queda nos repasses realizados pelos FPE (Fundo de Participação dos Estados) e FPM (Fundo de Participação dos Municípios).

Associações e entidades de classe como a CNI, Abimaq, FecomércioSP, Abrasf, Sindifisco Nacional e Comsefaz também se posicionaram contra o projeto, que agrava as condições para o setor produtivo. Entre as principais críticas, estão:

·         O fim dos Juros sobre Capital Próprio (JCP);

·         A cobrança de IR na distribuição dos dividendos, isentando empresas do Simples Nacional e do Lucro Presumido;

·         A redução da alíquota do IR condicionada ao aumento da arrecadação.

O governo reage a estas críticas com grande cinismo. “Se os proprietários de empresas estão dizendo que os impostos estão aumentando, enquanto os estados e municípios estão contra a reforma porque os impostos estão caindo, eu acho que nós chegamos a um ponto de equilíbrio interessante. Não deve estar caindo nem subindo, porque, se os dois estão reclamando, possivelmente estamos em um ponto de equilíbrio interessante”, afirmou Paulo Guedes em entrevista à Jovem Pan (fonte: Folha de São Paulo).

Janela de oportunidade perdida

A verdade é que o PL 2.337/21 passou por várias mudanças, desde que foi apresentado em junho. O relator do projeto, deputado Celso Sabino (PSDB-PA), segue alterando o texto original e divulgando novas versões, sem apresentar a versão definitiva para a votação. É uma total falta de segurança e transparência para a sociedade e até mesmo para os deputados, que não sabem bem o que estão votando.

O projeto ambicionava a simplificação tributária, mas pode aumentar a complexidade e o risco de contenciosos, demonstrando falta de aprofundamento na elaboração e a ausência de objetivos claros. A insistência em manter o projeto em pauta mostra o despreparo e incapacidade do governo federal, para o qual a janela de oportunidade para a reforma tributária passou.

Sucessivas ameaças às instituições e à Constituição por parte do governo levaram o país, também, a um quadro de crise institucional. Governando com foco nas eleições de 2022, o presidente Bolsonaro antecipou as turbulências políticas esperadas apenas para a véspera das eleições, eliminando as condições para a realização de grandes reformas.

Comissão de Especialistas

A Reforma Tributária deve atender a interesses amplos. Deve ser norteada pelos princípios da Simplificação e Desoneração, de forma a promover o crescimento econômico. Se o governo atual não consegue realizar nenhum avanço na extensa agenda de problemas nacionais, que os brasileiros comprometidos com o futuro do país consigam desenvolver um projeto que conte com amplo consenso público.

Por esta razão, o Atlântico propõe a criação de uma Comissão de Especialistas para discutir e elaborar uma reforma tributária sistêmica. O foco é obter um consenso sobre o modelo tributário ideal, pronto para ser oferecido aos candidatos à Presidência em 2022.

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