Embora apenas 184 milhões de pessoas tenham sido recenseadas até 24 de janeiro, o IBGE estima a população brasileira em 207,8 milhões de habitantes. O trabalho de campo do Censo 2022 deveria ter acabado no final de outubro, mas as dificuldades para a coleta de dados provocaram sucessivos adiamentos. Os dados de 13,5% dos domicílios estão pendentes.
A prorrogação do período de coleta prejudica a qualidade dos dados, na medida em que as entrevistas se distanciam do período de referência, que julho de 2022. Além disso, mantém o país em uma espécie de “apagão” de informações demográficas, fundamentais para o planejamento da administração pública.
Em agosto de 2022, no pico do recenseamento, eram necessários 180 mil recenseadores, mas o IBGE conseguiu contratar apenas 112 mil. A baixa remuneração e o aquecimento do mercado de trabalho reduziram a disponibilidade de pessoal. Os atrasos nos pagamentos também fizeram muitos dos contratados desistirem.
Pandemia e Orçamento no caminho do Censo
Realizado a cada dez anos, o Censo estava programado para 2020, mas foi adiado pela pandemia e por cortes do Orçamento federal. Em 2022, uma decisão do Supremo Tribunal Federal obrigou Jair Bolsonaro a disponibilizar os recursos necessários. O IBGE, responsável pela execução da pesquisa, obteve apenas R$ 2,3 bilhões, ante R$ 3,1 bilhões do orçamento original (equivalentes a R$ 3,7 bilhões, com a correção da inflação), e ainda precisou reduzir os questionários.
Problemas orçamentários já haviam levado o IBGE a cancelar a Contagem Populacional de 2015. Com isto, a defasagem em relação ao Censo 2010 ficou ainda maior.
Além da falta de recenseadores, o IBGE enfrenta dificuldades para coletar dados em favelas e a resistência dos moradores nos domicílios de alta renda. O fato de o levantamento ter ocorrido durante o período eleitoral contribuiu para gerar esta resistência.
Para que serve o Censo?
O primeiro Censo do Brasil foi realizado há 150 anos, na época do Império. Desde 1940, vem sendo realizado a cada dez anos pelo IBGE. É a única pesquisa que visita todos os domicílios do país. Seu objetivo é investigar o perfil da população, pois, além da contagem, coleta informações sobre a frequência às escolas, saneamento, tipo de moradia e renda, entre outros.
Os dados coletados embasam outras pesquisas e a formulação de políticas públicas. Eles permitem, por exemplo, calcular o percentual de crianças matriculadas nas escolas e de crianças que abandonaram os estudos, traçando um perfil da evasão escolar. Permite também calcular a expectativa de vida dos brasileiros, a partir da quantidade de pessoas em cada faixa etária e a taxa de mortalidade.
Os dados coletados ainda indicam ao setor público as áreas prioritárias para os investimentos em saúde, educação, habitação, transporte e energia.
Mesmo o setor privado depende dos dados demográficos para análises de mercado, planejamento estratégico e até na elaboração de pesquisas eleitorais.
O Censo e os impostos
O cálculo dos repasses de recursos públicos federais aos estados e municípios, realizado por meio do Fundo de Participação dos Municípios (FPM) e o Fundo de Participação dos Estados e do Distrito Federal (FPE), também são fundamentados nos dados coletados pelo Censo.
O Tribunal de Contas da União toma como base a população residente em cada município. Dados preliminares do Censo 2022, indicam que 863 municípios tiveram queda de habitantes e serão rebaixados de faixa populacional, enquanto outros 331 municípios tiveram aumento de população suficiente para passarem para uma faixa mais alta.
A atualização dos dados populacionais ainda tem implicações importantes na representatividade política. Sem as informações corretas sobre o contingente populacional, não se pode estabelecer o número de representantes de cada ente federativo.
Alguns países estão evitando a realização de pesquisas censitárias, devido ao seu alto custo. Estão trabalhando com registros de nascimentos e mortes. Ou, como no caso dos países europeus, com o registro administrativo de todos os habitantes. Entretanto, enquanto estas alternativas não estiverem disponíveis no Brasil, a realização do Censo é indispensável. O exercício de políticas públicas assertivas e o devido acompanhamento dos resultados depende de uma base de dados robusta e atualizada. Sem ela, não é possível garantir a eficiência da aplicação dos recursos públicos.