Constituição de 1988: revisão para voltar a crescer

A Constituição de 1988 teve um caráter transformador, tornando-se uma generosa carta de direitos, reagindo a um passado recente de autoritarismo e ao legado de desigualdade, pobreza e atraso.

 

A desconfiança dos constituintes abriu espaço a um amplo leque de políticas públicas, visando promover o acesso à educação, saúde e assistência social, além de assegurar atenção especial a grupos vulneráveis.

 

Entretanto, estes mesmos constituintes incluíram uma série de cláusulas regidas pela nossa forte cultura corporativista e patrimonialista, voltadas a concentrar renda e poder por meio de privilégios, favorecendo alguns setores econômicos e segmentos burocráticos.

 

Na política, a estratégia foi dispersar o poder. Além de um complexo regime federativo, o constituinte definiu um modelo presidencialista, dependente de uma coalizão parlamentar ampla e custosa para funcionar. A adoção do voto proporcional, com lista aberta, em grandes distritos eleitorais, levou a uma natural hiper fragmentação partidária, ampliação dos custos eleitorais, além de uma crescente heterogeneidade na formação das coalizões.

 

A desconfiança dos constituintes também transferiu enormes poderes – além de autonomia financeira e administrativa, às instâncias de controle e aplicação da lei, especialmente ao Ministério Público e ao Supremo Tribunal Federal.

 

Críticas à Constituição de 1988

Desde sua promulgação, a Constituição de 1988 foi criticada com base em três pontos. Primeiro, sua ambição normativa levaria a uma enorme frustração social, à medida que o Estado não fosse capaz de cumprir as promessas constitucionais. Segundo, o caráter incompleto demandaria a constante atuação do legislador. Por fim, apontava-se que a amplitude temática e o detalhamento tornaram o texto rapidamente obsoleto.

 

A Constituição de 88 tem sobrevivido a mais de três décadas através de 125 emendas constitucionais. Algumas alterando o mesmo assunto várias vezes.

 

Mais importante que o número de emendas, são as gigantescas mudanças qualitativas que uma única emenda pode promover, exaurindo o texto e causando muita insegurança jurídica.

 

Ruptura Institucional

Na visão do ex-presidente Michel Temer, uma Assembleia Nacional Constituinte somente se justificaria se houvesse uma ruptura do sistema jurídico constitucional, algo que o professor Modesto Carvalhosa acredita que já ocorreu. Na opinião de Carvalhosa, a ruptura institucional é identificada pela “ausência de legitimidade das instituições, refletida na perda do respeito da cidadania pela autoridade do Estado e na incapacidade manifesta dos mandatários de exercerem as suas funções em prol do interesse público. Diante da imoralidade da conduta de mandatários que governam e legislam em causa própria, diante de magistrados de cúpula incapazes de interpretar a Constituição a favor da ordem pública, da segurança da sociedade e da paz social, o povo não acata espontaneamente o poder constituído, nada mais sendo necessário para caracterizar o divórcio entre a Nação e o Estado. A ruptura político-institucional não precisa ser fruto de revolta sangrenta”.

 

Entre vários exemplos que demonstram a falência do atual texto constitucional, destaca-se o descalabro do STF. Para o professor Adilson Abreu Dallari, o Supremo traiu o seu papel essencial de guardião da Constituição, passando a ser “seu maior violentador, sendo negligente na jurisdição e hiperativo na prática de atos legislativos e nas decisões tipicamente administrativas, evidenciando um facciosismo incontestável.”

 

O STF tem reescrito a Constituição, proferindo decisões contrárias aos seus mandamentos. Por mais que sejam bem-intencionados e desejem lançar luzes sobre pontos obscuros da sociedade brasileira, os ministros não foram investidos na posição de legislar e conduzir o país. Sem o compromisso com o seu verdadeiro papel, tornaram-se vulneráveis ao exercício ilegítimo do poder a eles delegado, podendo atropelar o Legislativo, o Executivo e o próprio eleitorado. Ou seja, atuando em desfavor da democracia.

 

Disfuncionalidade prejudica reformas

O Brasil precisa de instituições que estimulem os indivíduos a promover o crescimento econômico, o que exige a revisão constitucional e a reengenharia do Estado.

 

A disfuncionalidade da Constituição em vigor é demonstrada pela dificuldade em realizar as reformas necessárias. A reforma administrativa consegue ter alguma viabilidade apenas se for um projeto parcial e limitado no tempo. Os projetos de Reforma Tributária empacam em barreiras intransponíveis. O Orçamento Público segue engessado e desvirtuado, sob a regência da Lei 4.320/64, incompatível com o tratamento constitucional dado atualmente à matéria.

 

Outra questão importante é que, sem a remoção de diversos benefícios e privilégios de natureza patrimonialista e corporativista, incrustados nos sistemas tributário, previdenciário e de financiamento das atividades econômicas, os esforços de redução da desigualdade determinados pela Constituição serão inviabilizados.

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