Publicado originalmente no jornal Estado de Minas, em 31/05/2025.
Devo à minha amiga Adriana Di Salvo, do Instituto Atlântico, a sacada do ano, quando assim se referiu à mais recente tentativa de tunga ao pagador de impostos brasileiro: “Paulo, esse é o IOF Reborn!” A exclamação não poderia ser mais inspirada e precisa. O boneco tributário criado semana passada pela equipe de Fernando Haddad, com a concordância de Lula, revela até que ponto viramos um País desrespeitado por Brasília e seus ocupantes políticos. A tentativa de elevar a taxa do IOF sobre quase todas as operações de crédito, câmbio e seguros, com finalidade declaradamente arrecadatória, é um golpe baixo no estômago dos já agredidos contribuintes nacionais. Se mantida, a medida tem potencial de elevar o custo dos empréstimos e financiamentos entre 20 e 30%, dependendo da incidência nesse ou naquele segmento e de como se faça a conta do IOF majorado sobre o custo efetivo de uma operação de crédito. Se, entretanto, a questão mais grave da economia brasileira é o absurdo custo financeiro e tributário que recai sobre as atividades produtivas e de consumo, debilitando a capacidade de competição do País, por que diabos haveria o ministro da Fazenda, encarregado da orquestra da economia, desafinar a ponto de propor uma medida que, justamente, vem agravar os encargos financeiros por meio de mais um tributo da pior qualidade técnica?
Brasília, mais uma vez, pariu um “reborn”. Trata-se de uma medida que já nasce sem vida. Do lado jurídico, não demorou um minuto para os especialistas em direito constitucional apontarem a inviabilidade legal do Decreto. De fato, numa democracia não se pode manipular as regras tributárias sem antes combinar “com os índios”. Quer dizer, para alterar regras de arrecadação, o governo deve ir ao Congresso para obter aprovação da medida pretendida. Se o Congresso concordar, então se respeitará um prazo (em geral o exercício fiscal seguinte) para a nova regra vigorar. Numa verdadeira democracia, o cidadão não leva sustos nem sofre bullying dos inquilinos do poder. A Constituição protege o contribuinte de arbitrariedades. Aqui não foi esse o caso. O IOF Reborn nasceu da imaginação curta de assessores mal informados da Fazenda, que desconhecem o comando constitucional. O IOF – Imposto sobre Operações Financeiras- tem finalidade, estritamente, de regular fluxos monetários na economia e não pode servir para fazer caixa, ainda que sua incidência, quando positiva, até gere alguma receita fiscal. Em outras palavras, o IOF é um imposto feito para ser ZERO em condições normais dos mercados, sendo ativado apenas quando algum freio financeiro se torna imperativo em certas condições de mercado. Por isso, não depende, neste caso específico, de prévia aprovação parlamentar.
O IOF Reborn não poderá prosperar. É obrigação do Congresso brasileiro agir contra o famigerado Decreto, aliás já parcialmente revogado na primeira chiadeira dos bancos contra a medida, no âmbito cambial. Resta agora defender o lado dos pequenos, já que o tal IOF incide sobre créditos para pequenos negócios e sobre financiamentos em geral. Tudo indica que o governo terá que recuar. É um papelão que a Fazenda não precisaria praticar. O ministro alega, perdido no baile, que “por ora, a medida permanece, por falta de alternativas” . Mas há alternativas. Uma delas é parar de inventar e começar a fazer o dever de ministro da Fazenda: controlar e, se necessário (esse é o caso), revisar todo o orçamento ora em execução. Os gastos públicos exorbitam há muito tempo. Existe um suposto “arcabouço fiscal “ destinado a pautar os limites do gasto público. É na despesa que reside o desafio de controle, e não no bolso do contribuinte onde o governo Lula gosta de ir buscar a solução para financiar sua inveterada gastança.
O recente episódio da funcionária apegada a um bebê reborn, que resolveu apelar à justiça trabalhista para reivindicar sua “licença maternidade”, negada pelos insensíveis patrões de uma mãe de boneca, dá uma dimensão do teatro do absurdo praticado hoje por Brasília sobre seus súditos. Brasília também reivindica que o País continue ninando e dando de comer às bonecas reborn criadas pelo Planalto. Todos sabemos que bonecas não falam porque nem vivas são. Mas as consequências do grave descolamento da realidade são, sim, um grave problema para um País que pretende voltar a se reencontrar com a porta da prosperidade.

Paulo Rabello de Castro, formado em Economia e Direito, M.A. e Ph.D pela Universidade de Chicago, ex-Presidente do BNDES e do IBGE, fundador e sócio da RC Consultores. Fundador do Instituto Atlântico e da OSCIP Instituto Maria Stella. Fundou o Movimento Brasil Eficiente, que propõe uma simplificação da carga tributária e mais eficiência dos gastos públicos. É autor de mais de 10 livros, entre os quais O Mito do Governo Grátis, Rebeldia e Sonho e Lanterna na Proa.
O artigo acima não representa, necessariamente, a opinião do Atlântico.