O segundo programa da série “Atlântico Recebe” contou com a participação do advogado, jurista e professor Ives Gandra da Silva Martins, que discutiu as perspectivas da revisão constitucional. Ives Gandra foi entrevistado por Rafael Jordão Motta Vecchiatti, presidente do Atlântico – Instituto de Ação Cidadã.
Assista a íntegra do programa:
Rafael Vecchiatti destacou que precisamos de uma revisão constitucional desde 1994. Em sua opinião, a revisão é imprescindível para o Brasil crescer sem amarras e com segurança jurídica.
Ives Gandra começou a análise lembrando que a Constituição de 1988 teve seis emendas revisionais e mais 109 emendas do processo regular, totalizando 115 emendas em 33 anos. Para se ter ideia da violência que estas 115 emendas representam, a Constituição americana foi promulgada em 1787 e tem apenas 27 emendas, sendo que as dez primeiras são artigos.
“A Constituição de 1988 tem uma espinha dorsal boa”, afirmou Ives Gandra. “Por exemplo, os direitos e garantias individuais constituem um elemento positivo”, completou.
Invasão da competência dos poderes
O jurista explica que a Constituição deixou bem claro que os três poderes deveriam ser harmônicos e independentes. Em primeiro lugar, ficaria o poder Legislativo, que tem representado a situação e a oposição. Em segundo lugar, o poder Executivo, que representa a situação. E, por fim, o poder Judiciário, ao qual cabe apenas respeitar as leis elaboradas pelos representantes do povo. Enquanto o poder Legislativo e o poder Executivo foram eleitos pelo povo, a Suprema Corte do poder Judiciário foi eleita por apenas um indivíduo.
Mas, Ives Gandra ressalta que passamos a ter uma interpretação da Constituição por parte de um poder. “A interpretação da lei em causa própria, em seu interesse exclusivo, transformou o Judiciário no grande poder da República.”, afirmou Ives Gandra. “Quando a Suprema Corte diz que vai fazer a lei, está violando os direitos do povo, que elegeu o Legislativo e o Executivo.”
Ives Gandra considera o momento inadequado para a reforma constitucional, em razão da pandemia e da crise econômica, mas considera que a reforma administrativa deveria ser feita de imediato. “A carga tributária é elevada, porque temos uma carga burocrática elevadíssima. O peso da mão de obra da administração pública nos países da OCDE está em torno de 9% do PIB, enquanto no Brasil está em 13,6%. Mas, como modificar a carga burocrática, se o peso do Judiciário é de 1,34% do PIB, enquanto na maioria dos outros países não atinge 0,2% do PIB?”, questionou.
Ele destaca que todos tiveram perdas no setor privado durante a pandemia. As empresas perderam contratos e os trabalhadores tiveram que fazer acordos de redução de salários. No setor público, entretanto, o STF não admitiu a calamidade pública, não permitindo a redução de seus salários e, ainda, mantendo o recebimento dos penduricalhos – muitos deles sem sentido no trabalho home office.
Reformas Infraconstitucionais
Na visão de Ives Gandra, a revisão constitucional é necessária e deverá ser realizada, mas apenas após o fim da crise econômica, devido aos custos de adaptação das empresas. Neste momento, as reformas devem ser infraconstitucionais, como a reforma administrativa e outras reformas de simplificação tributária.
Como relação à invasão da competência do poder Legislativo por parte do poder Judiciário, a Constituição atual oferece mecanismos de defesa, como o Artigo 49, Inciso XI, o qual declara caber ao poder Legislativo zelar por sua competência normativa perante os outros poderes. Portanto, explica o jurista, o Decreto Legislativo é o instrumento que pode declarar nula uma decisão do STF que invada a competência do Legislativo.