O novo coronavírus provocou uma crise sem precedentes, tanto na saúde pública, como na economia. Porém, a crise também tem um caráter disruptivo que, se bem conduzido, pode ter efeitos positivos sobre a economia brasileira. Por exemplo, muitos projetos que antes demorariam anos para se tornar realidade foram colocados em prática rapidamente, como os aplicativos criados para a educação à distância.
Está ocorrendo um processo de destruição criativa, como preconizado pelo economista Joseph Schumpeter. Na visão do economista e membro do Atlântico Paulo Rabello de Castro, temos que dar ênfase na questão da criatividade, procurando soluções arrojadas para sair da crise e colocando a economia brasileira em um ciclo virtuoso de crescimento. O nosso maior empecilho é a “estagnação criativa” de Brasília, como afirma o economista.
Rabello de Castro explica que devemos distinguir os estímulos econômicos por meio da “irrigação” financeira e monetária e os estímulos por meio da elevação de gastos. O Estado brasileiro já vem adotando uma política fiscal frouxa há décadas e não deve elevar os gastos, sem considerar o impacto sobre o orçamento fiscal. A política monetária, que tem sido bastante restritiva, é que deve mudar. Em sua opinião, os estímulos monetários devem ser até mais robustos do que os que foram adotados até agora.
Na opinião do economista, a expansão da base monetária e do crédito em um contexto de economia aberta e capacidade instalada ociosa não irá provocar inflação, mas o aumento do produto. Tomando como exemplo a crise financeira de 2008/2009, as operações de expansão monetária realizadas pelo FED nos EUA – os Quantitative Easing – não apenas estimularam a economia, como geraram resultado positivo para o FED.
O governo possuiu uma série de instituições de alto nível técnico, que estão sendo mal utilizadas, como o Banco do Brasil, a Caixa Econômica Federal, o Banco Central e o BNDES. Por exemplo, a utilização do cartão BNDES Direto deveria ser ampliada, para apoiar as micro e pequenas empresas. Além do capital de giro, o cartão BNDES Direto possibilita a realização de pequenos investimentos de forma imediata, como a compra de computadores para aperfeiçoar a plataforma digital de e-commerce destes empreendedores.
O BNDESPar poderia ter agido durante a queda vertiginosa dos preços das ações na bolsa, comprando ações das empresas e sustentando o preço de mercado. As ações poderiam ser renegociadas na alta, durante o próximo ano, em uma operação bastante lucrativa para o banco, gerando recursos para o próprio governo.
Paulo Rabello de Castro considera os auxílios direcionados para as pequenas e médias empresas – geradoras da maior parte dos empregos no país – insuficientes. Dos cerca de 55 bilhões anunciados, a maior parte era referente a adiamento de empréstimos já contratados e apenas 5 bilhões referem-se a novas linhas de crédito. Segundo ele, é preciso ter coragem para fazer mais.
O governo possui uma série de recursos financeiros “empoçados”, como as reservas compulsórias e o FGTS; são recursos que podem e devem ser utilizados neste momento. O BCB liberado 100 bilhões das reservas compulsórias, mas poderia ter sido mais arrojado e liberado 300 bilhões, segundo Rabello de Castro.
Outro exemplo de ativos ociosos são as reservas cambiais. O Brasil possui cerca de 400 bilhões de reservas, remuneradas a taxas muito baixas e mantidas por receio de uma crise cambial, que é uma hipótese muito remota atualmente. Parte destes recursos – 50 bilhões seriam o suficiente – poderia ser utilizada para a criação de um fundo de investimentos em infraestrutura.
O que não pode ser feito pelo BCB e pela política monetária é um plano econômico para a retomada do crescimento, e a transformação da crise no mote para uma inflexão no nosso processo de desenvolvimento. A crise pode ser uma oportunidade para a reformulação de processos e o reposicionamento industrial do Brasil, com o avanço de uma indústria 4.0. Com um programa de investimentos adequado, a indústria brasileira pode passar a suprir o mercado mundial com uma nova geração de produtos industriais.
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