Marcel Solimeo*
Que país é esse que, com tantos problemas urgentes, como pandemia, desemprego, crise energética e hídrica, inflação crescente e desemprego elevado, entre outros, parece viver em uma “Realidade Virtual”, na qual tudo se passa diferente?!
O governo enviou ao Congresso o projeto do IR, ignorando as dificuldades reais das empresas e da população. A Câmara confunde complexidade com necessidade, impondo urgência na tramitação, enquanto ignora a Reforma Administrativa, que deveria ter precedência na ordem lógica dos temas.
O Senado promove uma CPI que oscila entre o cômico e o trágico, faltando apenas convocar o homem do café do Ministério da Saúde. Temas importantes deixam de ser debatidos enquanto isso.
O Supremo, com base na “Constituição Virtual”, absorve poderes do ministério público, do executivo e do legislativo e, impondo sua suprema vontade, cassa fantasmas, cobra explicações e impõe decisões.
O presidente, em sua “Realidade Virtual” se sente perseguido e ameaçado e procura dar demonstrações de força, que só revelam fraqueza.
A imprensa, escrita e televisada, trava uma disputa por manchetes e chamadas sensacionalistas, que mais revelam posições, do que informações, sobre temas irrelevantes para o dia a dia do cidadão, mas que retroalimenta disputas entre o governo e os políticos. Cada manchete provoca uma reação dos personagens para ganhar novos destaques.
As redes sociais se dividem entre pregar para convertidos e atacar o adversário, provocando aumento da radicalização, ou a expor a vida de personalidades que, muitas vezes, são promovidas de mediocridades a celebridades.
Aqueles que vivem no mundo real, como os empresários, lutam para sobreviver a tudo isso, mas não se organizam de forma unida e firme para defender suas posições. Os trabalhadores formais, temem a perda do emprego e da renda, enquanto os informais lutam a cada dia pela sobrevivência.
Na “Realidade Virtual” em que vive o Congresso, parece possível transformar o erro em acerto, como pretende a Câmara, ao querer aprovar o PL 2.337/21, apesar de sua inconsistência e inoportunidade, mediante mudanças pontuais.
Como todos os setores têm queixas contra o projeto, o Relator, em um esforço louvável, mas inútil, pretende atender a todos, com relatórios sucessivamente modificados ao sabor das pressões. Acontece que, com isso, a soma das partes está maior do que o todo, o que é aritmeticamente impossível.
Como dizia o mestre Eugênio Gudin, “todos têm razão, mas não dá para todos terem razão ao mesmo tempo”. Se haverá ganhadores, terá que existir perdedores. Na atual situação da economia, com o elevado nível da carga tributária e as dificuldades de grande número de empresas, especialmente para manter empregos, nenhum segmento do setor privado poderá perder. Como Estados e municípios também não, resta o governo federal, que não pode se queixar do desempenho da arrecadação do Imposto de Renda, mesmo durante a pandemia.
Como, parece, o governo não entrou no jogo para perder, talvez se acabe, por vias tortas, chegando à solução racional defendida desde o princípio pelas entidades e tributaristas, que é a retirada do Projeto e a criação de uma Comissão de Alto Nível para a elaboração de uma proposta abrangente e consistente de Reforma Tributária, enquanto o Congresso, voltando para a realidade, aprova a Reforma Administrativa.
* Marcel Solimeo é economista-chefe da da Associação Comercial de São Paulo (ACSP) e diretor-conselheiro do Atlântico – Instituto de Ação Cidadã.