Tramitam no Congresso o PL 1087/25 e a Reforma Tributária, que têm como ponto comum a inviabilização ou, no mínimo, a redução de suas vantagens, e as discussões se dividem em dois grupos principais: o que defende a manutenção dos projetos como estão, sem se preocuparem com o impacto sobre o SIMPLES; e o daqueles que defendem o encontro de soluções para preservar as principais vantagens do SIMPLES.
Os defensores do primeiro grupo consideram que devem predominar as propostas modernizantes dos dois textos, que visam colocar o sistema tributário nacional compatível com os dos países da OCDE, sem considerar que nesse organismo a tributação não é uniforme, pois muitos possuem alíquotas diferenciadas, isenções, incentivos e outras modalidades de tributação que os diferenciam entre si, ao contrário do que se propaga que seja o sistema tributário desses países. Criticam o SIMPLES, classificando-o como sendo “renúncia fiscal”, foco de distorções que facilitam a sonegação, que impede a inovação e o crescimento das empresas. Não propõem, no entanto, a simples extinção do SIMPLES.
O outro grupo, o dos defensores, considera que o SIMPLES deve ser intocável, pelo menos naquilo que é a sua vantagem principal, que é a simplificação do sistema de escrituração e pagamento dos impostos, e, em alguns casos, uma alíquota geral menor. Se subdividem ainda em dois grupos, o dos que consideram que o PL 1087/25 deve ser recusado e a PEC totalmente reformulada, e aqueles que consideram possíveis correções que viabilizem a sobrevivência do SIMPLES.
À primeira vista, parece que essas discussões podem ser entendidas a partir de duas visões. A dos que defendem a modernização da tributação com base nas experiências internacionais, e a dos que entendem que os sistemas tributários devem refletir suas realidades: territoriais, políticas, empresariais, tecnológicas, educacionais, econômicas e geopolíticas. Países federativos e democráticos, no geral, tendem a ter sistemas tributários mais descentralizados, ao contrário dos países unitários e dos estados intervencionistas, que são mais centralizados.
Sendo assim, devemos considerar a realidade brasileira para, a partir dela, discutirmos o sistema tributário ideal, embora sempre seja útil conhecer as experiências de outros países. O Brasil é um país continente, com profundas desigualdades territoriais, sociais e de desenvolvimento. Jacques Lambert escreveu um livro, “Os Dois Brasis”, mostrando as diferenças, que desde 1958, quando foi escrito, em muitos sentidos se aprofundaram. Há mais de dois anos escrevi o artigo “RT e a Realidade Empresarial”, defendendo que, primeiro, se analisasse o quadro das empresas, depois os problemas tributários existentes para, então, formular a proposta de reforma. Isto porque, partir de um projeto pré-fabricado, por mais bem elaborado que fosse, poderia não se encaixar na realidade.
Mostrei que o quadro empresarial brasileiro é formado, em grandes números, por cerca de 24,5 milhões de empresas, das quais, aproximadamente, 14 milhões são MEIs, o que significa que sobram 9,5 milhões de empresas que estão sujeitas à tributação do consumo de bens e serviços, das quais 9 milhões são micros e pequenas. Como cerca de 9 milhões delas estão no SIMPLES, restam mais ou menos 500 mil empresas submetidas às regras do IVA.
Dessas, provavelmente metade será sujeita ao IVA sem reduções ou regimes especiais, ou seja, o que, segundo os autores, deveria ser a norma geral. Talvez um quarto delas se beneficie de alíquotas reduzidas, enquanto outro tanto goze de regimes especiais.
Essa é a realidade do Brasil.
Com base nessa realidade, é que devemos analisar se devemos avançar com o PL 1087/25 e com a RT sem considerar a inviabilização do SIMPLES, ou se devemos rever essas propostas, mesmo tendo que alterar pontos essenciais?
Particularmente, considero essencial preservar o SIMPLES, embora se possa fazer alguns ajustes, como uma escada de saída, mesmo que implique em mudanças nos textos do PL e da RT. Isto porque a inviabilização do SIMPLES acarretaria não apenas aumento da informalidade e desestímulo ao empreendedorismo, que, junto com os profissionais liberais, constituem a classe média.

Marcel Solimeo é economista e consultor, é superintendente do IEGV/ACSP, desde 1963, e assessor político e econômico da Presidência da ACSP. Foi superintendente institucional da Associação, coeditor dos livros “O Plano Real Para ou Continua?” e “O Plano Real Acabou?”, autor do texto “A Vocação dos Municípios”, publicado no livro “O Município Moderno”, e de inúmeros artigos em jornais e revistas. Formou-se em Economia pela FEA/USP em 1963, e fez pós-graduação em Economia Pública pela mesma faculdade. Por mais de 20 anos, foi assessor econômico do Clube de Diretores Lojistas de SP e da Confederação Nacional de Diretores Lojistas.
O artigo acima não representa, necessariamente, a opinião do Atlântico.